Comprometimento Cognitivo Maior ou Demência
O termo “Demência” ou “Comprometimento Cognitivo Maior”, significa qualquer alteração na estrutura cerebral que leve a pessoa à perda de sua autonomia cognitiva, devido a alterações na memória e/ou outras funções, como planejamento, raciocínio, atenção e linguagem. Ou seja, o indivíduo passa a depender de ajuda para poder lidar com suas finanças, realizar atividades fora de casa, cozinhar, ou até mesmo (em uma fase mais avançada) realizar atividades relacionadas ao cuidado pessoal, como lembrar de tomar os medicamentos, usar o banheiro, vestir-se e alimentar-se.
Outras alterações neurológicas podem estar associadas a aspectos como depressão, ansiedade, insônia, agitação, delírios, alucinações, tontura, quedas, engasgos, incontinência e perda de peso. Existem dezenas de causas de Demência e as mais comuns são a demência de Alzheimer (50%), a demência vascular (15%), a demência por corpúsculos de Lewy (5%), a demência da doença de Parkinson (5%) e a demência frontotemporal (3%).
Comprometimento Cognitivo Leve (CCL)
O Comprometimento Cognitivo Leve corresponde a um estágio intermediário entre a normalidade e a demência. A pessoa apresenta um funcionamento cognitivo inferior a um ou dois anos atrás, em termos de memória ou outras funções cognitivas, mas ainda consegue manter a sua autonomia às custas de um maior esforço. Começa a ter o hábito, por exemplo, de anotar tudo de importante para não esquecer. O CCL pode evoluir para uma fase demencial, com perda da autonomia, estacionar ou até mesmo retornar à normalidade. Um exemplo do primeiro caso é o de uma doença neurodegenerativa como Alzheimer ou vascular não tratada.
O tratamento preventivo dos fatores de risco para a demência vascular são um exemplo de estabilização da perda cognitiva no segundo caso. Na terceira situação é a progressiva retirada de medicamentos de tarja preta para dormir, com melhora da atenção, da memória e eventual retorno à normalidade.
Doença de Alzheimer (DA)
As alterações moleculares da Doença de Alzheimer começam a ocorrer no cérebro pelo menos 20 anos antes dos primeiros sintomas e 15 anos antes dos primeiros sinais de neurodegeneração. Isso abre um grande potencial de identificação precoce e prevenção da evolução dessa doença. Os primeiros sintomas costumam envolver alterações na percepção do olfato no cérebro (anosmia), esquecimentos e desorientação espacial.
As alterações iniciais de memória são leves e levam ao Comprometimento Cognitivo Leve (CCL). Em cerca de 1 a 3 anos, com a evolução da atrofia da região da memória recente (hipocampo), a doença avança para a perda da autonomia (fase I ou inicial). Em uma sequência de mais dois anos, em média, a pessoa entra na fase moderada (II), o déficit de memória avança e surgem também alterações em outras áreas cognitivas, como raciocínio, linguagem e atenção.
Na fase avançada (III), os déficits cognitivos são tão significativos que a família passa a ter extrema dificuldade para levar o paciente a um restaurante, por exemplo. Essa última fase é a mais longa, durando em média 6 anos. Há variantes menos comuns da DA que podem evoluir de modo diferente. Em qualquer um dos casos, o tratamento adequado do Alzheimer pode fazer com que a memória do paciente melhore, em média, para um nível anterior de 6 meses, além de oportunizar a diminuição da progressão da doença em cerca de 20%.
Demência (Micro)Vascular (DVa)
A Demência Vascular pode ocorrer devido ao episódio de um grande Acidente Vascular Cerebral (AVC) ou a múltiplas e progressivas pequenas isquemias. Nesse último caso, trata-se da antiga “esclerose” que gerou o igualmente obsoleto termo “esclerosado”. Essa palavra deriva da “aterosclerose progressiva”, já que a doença pode ser prevenida em até 90% com a devida identificação e tratamento dos seus fatores de risco, como a hipertensão, o diabetes e o tabagismo.
A Demência Vascular costuma causar mais apatia e alterações no raciocínio do que de memória. Além disso, ela também costuma estar associada a alterações para caminhar, engasgos, incontinência urinária e depressão. O correto diagnóstico e tratamento podem estagnar a evolução da doença e melhorar em graus variáveis a apatia, o raciocínio, a fala e a memória.
Acidente Vascular Cerebral (AVC)
O Acidente Vascular Cerebral (AVC) leva à morte dos neurônios relacionados àquela artéria lesada, seja por isquemia (80%), seja por hemorragia (20%). No acidente isquêmico transitório (AIT), há sintomas relacionados à isquemia assim como no AVC, porém os neurônios são reperfundidos pelo próprio organismo a tempo de não morrerem. Com isso, não há sequela definitiva; por isso o AIT também é popularmente conhecido como “ameaça de AVC”. No AVC consolidado, entretanto, a morte desses neurônios vai acarretar uma sequela duradoura relacionada à função dessa região do cérebro. Assim, pode haver perda de força e da sensibilidade, alterações cognitivas, na fala, para engolir, no equilíbrio ou na visão, como visão borrada ou dupla.
No entanto, a maioria dos AVCs são pequenos e silenciosos. Esses pequenos AVCs podem ser detectados por ressonância e muitas vezes aumentam em número e causam alterações cognitivas e motoras (parkinsonismo microvascular). Além disso, são um prenúncio de que um AVC maior está por vir. A prevenção primária (antes de ocorrer) ou secundária (de novos AVCs) é uma realidade que pode chegar a até 90% dos casos. Por isso, deve-se identificar e tratar rigorosamente os fatores de risco, como a hipertensão, o diabetes, o tabagismo e as arritmias cardíacas. Muitas das sequelas do AVC podem ser melhoradas com um adequado programa de fisioterapia e fonoaudiologia, além do tratamento da depressão, das alterações cognitivas e da incontinência, sintomas que estão frequentemente associados.
Doença de Parkinson (DP)
Muito associada aos tremores, a Doença de Parkinson nem sempre é a causa desses movimentos involuntários e rítmicos, principalmente no início da doença, sendo que metade dos pacientes não apresentam essa característica. O tremor, quando presente, é uma característica unilateral e de repouso. Os demais são lentificação dos movimentos (bradicinesia), rigidez ao exame médico e instabilidade postural ou risco aumentado de quedas. Desses, o mais importante é a lentificação dos movimentos. A presença de ao menos um deses sinais e a resposta ao tratamento específico são muito sugestivos do diagnóstico. As alterações não motoras da DP podem anteceder os sintomas motores em até três anos e incluem: depressão, diminuição do raciocínio, sono agitado, impotência sexual, urgência para urinar, dor muscular, constipação e hipotensão postural (pressão baixa ao ficar de pé). Outras causas comuns são o parkinsonismo microvascular (que também pode causar demência) e o parkinsonismo iatrogênico, ou seja, por medicamentos que causem esse efeito colateral.
O tratamento adequado da Doença de Parkinson proporciona ao paciente um excelente controle dos sintomas e uma boa qualidade de vida muitas vezes por mais de uma década.
Demência da Doença de Parkinson e Demência por Corpúsculos de Lewy
Essas duas causas de demência são muito semelhantes porque tem motivação em comum. O nome Corpos de Lewy é dado às alterações cerebrais características da doença, que tem sintomas parecidos com o Parkinson. A pessoa pode desenvolver rigidez na musculatura, passar a ter movimentos mais lentos e apresentar tremores. Alucinações visuais e auditivas, quedas frequentes e desmaios. Já a doença de Parkinson não é um tipo de demência, mas, os pacientes podem evoluir para quadros de demência. A diferença em comparação a corpos de Lewy está na localização da lesão no cérebro. Se for relacionado ao Parkinson, os sintomas costumam aparecer dois anos após o diagnóstico.
Os pacientes com esses diagnósticos são muito sensíveis a antipsicóticos, mas costumam ter uma boa resposta a um grupo de medicamentos também utilizados no Alzheimer. Um cuidado adicional no manejo é que os medicamentos para o parkinsonismo costumam piorar as alucinações, que na maioria das vezes são visuais.
Demência Frontotemporal (DFT)
A Demência Frontotemporal é a segunda causa mais comum de demência iniciada antes dos 70 anos (pré-senil). Assim como o Alzheimer, pode ter caráter familiar em cerca de ¼ dos casos, quando metade dos descendentes terão a tendência a desenvolver a doença.
Ao contrário do Alzheimer, entretanto, o déficit na fase inicial que mais chama a atenção dos especialistas não costuma ser a falta de memória, mas as alterações de comportamento (80%) ou de linguagem (20%). Em ambos os casos, a propensão é de haver alterações do raciocínio e de planejamento, bem como urgência para urinar. Na variante comportamental, pode ocorrer apatia ou desinibição social. Por desinibição social entende-se a perda dos “bons modos”, podendo inclusive haver desinibição sexual. Nas variantes iniciais de linguagem pode haver óbvia dificuldade para expressar-se (afasia primária progressiva) ou para compreender a linguagem (demência semântica). Ambas as variantes costumam evoluir de modo a incluir aspectos da outra, à medida que a neurodegeneração avança.
O diagnóstico e o tratamento adequados podem melhorar a apatia e a desinibição (medicamentos diferentes para cada caso). Já a capacidade de se expressar pode melhorar um pouco, mas a capacidade de compreensão é mais resistente ao tratamento.
Depressão
A depressão pode apresentar múltiplas causas; entre elas estão as doenças neurológicas e a dor crônica. As patologias cerebrais podem causar depressão diretamente, por diminuição de neurotransmissores, ou indiretamente, devido à limitação funcional e/ou cognitiva que podem acarretar. Nas demências (incluindo o Alzheimer) o Parkinson e o AVC são causas frequentes de depressão no idoso, tanto devido às lesões diretas que causam no cérebro, quanto às limitações acima descritas. A depressão está muito associada à ansiedade, à insônia e à dor crônica, podendo ser tanto causa quanto consequência desses outros problemas de saúde. Isso pode levar inclusive à formação de um círculo vicioso que tem que ser rompido pelo correto diagnóstico e tratamento dos distúrbios.
Ansiedade
Múltiplas doenças neurológicas podem fazer piorar o nível de ansiedade, especialmente em pessoas que já tenham predisposição. Isso ocorre devido a uma perda do controle cognitivo sobre as emoções. Diversos estudos demonstraram que os sintomas de ansiedade podem anteceder os sintomas de esquecimentos no Alzheimer, no Parkinson e na doença (micro)vascular cerebral. Nas doenças neurológicas os sintomas de ansiedade podem estar associados à insônia e à depressão.
Insônia e outras alterações do sono
Diversas doenças neurológicas podem causar distúrbios do sono devido às próprias lesões no cérebro. A pessoa com Alzheimer, por exemplo, pode passar a dormir mais de dia e ficar acordada à noite. Já os indivíduos com Parkinson e Lewy costumam apresentar um sono agitado, mexendo-se muito durante a noite. Por outro lado, a insônia, a apneia e outras alterações no sono costumam contribuir significativamente para causar esquecimentos, depressão e sonolência durante o dia. Em especial, a apneia do sono, mais frequente em obesos que roncam, é uma causa comum de pressão alta, principal causa do AVC. O correto diagnóstico desses problemas e o consequente tratamento adequado deve envolver tanto o tratamento medicamentoso quanto o comportamental.